Quinta-feira, 28 de março de 2024

Agência enquadra concessionária de ferrovia por abandono de trecho em MS

Rumo, que já acumula R$ 36 milhões em multas, foi autuada novamente por sucatear Malha Oeste

Publicado em: 21/04/2021 às 06h25


A Rumo Malha Oeste (RMO), mesmo com 167 processos administrativos na Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e multas acumuladas em R$ 36 milhões, continua sem fazer a devida manutenção na malha ferroviária entre Campo Grande e Corumbá. A Agência multou a concessionária por causa do abandono.

Fiscalização realizada no mês passado no trecho apontou que 523 locais descumprem normas de segurança, com 21.245 pontos tendo entre 2 e 11 dormentes estragados em sequência, “o que se trata de um enorme risco à segurança do tráfego de trens”.

A falta de manutenção persiste durante o processo de relicitação pedido pela concessionária no dia 21 de julho do ano passado. A autarquia atestou a viabilidade técnica da relicitação que está em andamento mesmo com a falta de prestação de conta pela Rumo Malha Oeste.

No dia 23 de março, a Superintendência de Infraestrutura e Serviço de Transporte Ferroviário de Cargas (Sufer) da ANTT autuou a Rumo Malha Oeste, o que pode ser convertido em multa de R$ 1 milhão, por não apresentar “relatório anual com demonstrações financeiras e prestações de contas do serviço concedido, bem como não fornecer informações aos órgãos governamentais nos prazos estabelecidos” referentes ao trecho, de acordo com a notificação nº 5805323, expedida pela autarquia. A empresa tem até o dia 23 para apresentar defesa.

Outras irregularidades foram constatadas na inspeção técnica realizada de forma remota entre os dias 8 e 12 do mês passado, que resultou no Relatório de Fiscalização nº 4/2021. O objetivo foi verificar a qualidade e a atualização dos trabalhos de manutenção e conservação da via permanente, bem como identificar eventuais descumprimentos de dispositivos legais e contratuais pela concessionária.

As análises e conclusões da equipe de fiscalização foram emitidas com base nas informações prestadas pela Rumo, em informações internas e também em registros feitos em inspeções anteriores. A inspeção verificou 462,1 quilômetros do trecho do Indubrasil, em Campo Grande, até Corumbá, na divisa com a Bolívia e os ramais de Porto Esperança e Ladário.

Os técnicos da autarquia constataram que a Rumo Malha Oeste “continua com o procedimento de postergação da manutenção do trecho, como já havia sido constatado nas inspeções em campo realizadas em anos anteriores”. Foi apontado que na inspeção automatizada de geometria realizada em julho de 2020 “constatou-se que 523 locais descumprem os parâmetros mínimos estabelecidos na norma ABNT NBR 16.387/2020”.

Já a análise das condições dos dormentes, realizada entre maio e agosto do ano passado, mostra 21.245 locais com “mais de 2 dormentes inservíveis em sequência, incluindo diversos locais com malhas de até 11 dormentes inservíveis em sequência”, enfatizando que “se trata de um enorme risco à segurança do tráfego de trens”.

São 362 pontos com 11 dormentes seguidos estragados, e no trecho todo 21,4% dos 805,9 mil dormentes teriam de ser substituídos, o que corresponde a 172,5 mil.

PRECARIEDADE MATERIAL

Com relação aos trilhos, a ANTT demonstrou que permanece a situação de precariedade do estado do material. “Tendo sido verificados desgastes de até 38% nos boletos, ressalta-se que, durante as últimas inspeções presenciais realizadas, foi constatado o estado precário dos trilhos ao longo de praticamente todo o trecho, tanto por problema de desgaste como também de patinados e outros defeitos”, alega a Agência no relatório.

“Com a baixa quantidade de trilhos prevista, conclui-se que a situação tende a piorar, mesmo com a baixa densidade de tráfego existente atualmente no trecho”, complementa.

Foi registrado um aumento de 81% na extensão de vias com velocidade restrita em relação à inspeção realizada em agosto de 2019, “reduzindo ainda mais a eficiência da operação e a capacidade de tráfego, além de promover a aceleração da degradação da via permanente.” Em um dos trechos, a velocidade máxima autorizada é de 15 km por hora, enquanto em outros dois a velocidade permitida é de 18 km por hora.

PASSAGENS DE NÍVEL

Outro descaso da Rumo é quanto às passagens de nível. A autarquia constatou que a grande maioria permanece com irregularidades. Das 201 notificações pela ANTT, somente 20 foram corrigidas.

Há também descaso da concessionária com relação às deficiências graves notificadas pela Agência, que não “vêm tendo a devida atenção da concessionária, uma vez que apenas 36% delas foram corrigidas”.

Na conclusão dos técnicos, “essa situação de perda de eficiência e segurança nesse trecho, assim como em praticamente toda a extensão da Rumo Malha Oeste, na prestação do serviço público de transporte ferroviário de cargas objeto da concessão caracteriza claras infrações a diversos dispositivos legais e contratuais, já tendo sido motivo de abertura de diversos processos administrativos ao longo dos últimos anos, inclusive com a proposição de caducidade da concessão, processo este que se encontra suspenso em virtude da solicitação, pela concessionária, de relicitação da malha”.

PUXÃO DE ORELHA

Também concluiu-se que o fato de estar em andamento o processo de relicitação da Malha Oeste não “exime a concessionária de cumprir com suas obrigações legais e contratuais, entre elas zelar pela integridade dos bens vinculados à concessão, mantendo-os em perfeitas condições de funcionamento e conservação até sua transferência à concedente ou à nova concessionária. Ou seja, não tem sentido a concessionária usar o seu pedido de relicitação da Malha Oeste como justificativa para a falta de zelo na manutenção da via”.

É ressaltado que o processo de relicitação ainda se encontra em análise pela Agência, sem definição a respeito, “e as obrigações da Rumo com relação à Malha Oeste permanecem até que seja concluída a sua transferência à concedente ou à nova concessionária”.

A Rumo alegou que vem atuando “de acordo com a criticidade dos defeitos indicados e sob demanda, trabalhando na manutenção corretiva e garantindo a segurança ferroviária da operação e o atendimento aos usuários, conforme informado nos autos do processo de relicitação da Malha Oeste”.