Sexta-feira, 29 de março de 2024

Estudo sinaliza que 20% da população tiveram covid-19, mas não dá para relaxar

Curva de casos começa a cair, e a imunidade de rebanho depende de como a população se comporta com relação às medidas de contenção, diz especialista

Publicado em: 01/10/2020 às 07h29


Saber se o Distrito Federal, de fato, alcançou ou não a imunidade de rebanho para covid-19 parece ser a pergunta de um milhão de dólares. Na semana passada, o governador Ibaneis Rocha chegou a afirmar que alcançamos a marca, baseado nos estudos que afirmam que, para cada caso confirmado, há outros 10 não detectados. A declaração foi dada junto a um alerta para não relaxar as medidas de proteção. No entanto, um estudo feito em parceria com pesquisadores de diversas universidades do país, e divulgado ontem, conclui que esta ainda é uma realidade distante. Segundo os pesquisadores, e considerando subnotificações e casos assintomáticos, apenas 20% da população do DF foi infectada até o momento.

A avaliação é feita em conjunto por professores da Universidade de Brasília (UnB), Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia (IFBA), Universidade Federal de São João del Rei (UFSJ), e Universidade do Estado da Bahia (Uneb). De acordo com o levantamento dos pesquisadores, todas as unidades da Federação estão muito distantes da real imunidade de rebanho, obtida quando a taxa de infecção da população está entre 60% e 70%.

Físico do Núcleo de Altos Estudos Estratégicos para o Desenvolvimento da UnB, Tarcísio Rocha Filho explica que estes valores são aplicados em situações quando não há quaisquer medidas paliativas de prevenção à doença. Segundo ele, embora estejamos distantes da imunidade, a curva de casos começa a cair devido às medidas de isolamento que ainda são adotadas. “Se todo mundo usa máscara, isso já diminui a probabilidade de transmissão de 30 a 50%. A imunidade de rebanho não é absoluta. Ela depende de como a população se comporta. A curva descer ou subir depende fortemente do grau de isolamento social”, destaca.

Para chegar aos valores, os estudiosos envolvidos precisaram considerar dados não contabilizados nos boletins oficiais de cada estado. Tarcísio explica que isso é possível graças aos dados de óbitos onde a subnotificação é menor. “O número de mortes tem uma pequena correção, porque certo percentual de vítimas da covid-19 não detectados são registrados como síndrome respiratória aguda grave (SRAG), principal causa de falecimento da doença”, detalha. É feita uma comparação com os dados da síndrome de anos anteriores e, a partir daí, é possível afirmar que o excesso de casos configura, em realidade, pacientes de coronavírus. “Com isso, sei a taxa de mortalidade total e o percentual real de infectados.”


Segunda onda

O especialista alerta para o risco de um aumento dos casos, se as ações de prevenção forem deixadas de lado. “Isso foi visto na Europa. Em Israel, foi preciso um fechamento duro. Em Manaus, há uma segunda onda. Lá, disseram que havia imunidade de rebanho. Se vai normalizando tudo, demora um tempo, coisa de um mês, mas você atinge as condições para a pandemia voltar com força.”

Um milhão de infectados

Uma outra pesquisa, também feita no DF, calcula números maiores de infecção. Os pesquisadores Breno Adaid, do Centro Universitário Iesb, e Thiago Nascimento, do departamento de Ciências Comportamentais da Universidade de Brasília (UnB), aplicaram um estudo feito por matemáticos da Universidade de Estocolmo (Suécia) e da Universidade de Nottingham (Reino Unido) à realidade local, e calcularam mais de 1 milhão de infectados até o momento.

A pesquisa identificou os valores para subnotificação a partir do número de casos registrados. Breno explica que as ocorrências crescem em alta velocidade, mas, a partir de um determinado momento, isso começa a desacelerar. É quando ocorre o chamado “cotovelo da curva”. De acordo com o pesquisador, este fenômeno acontece em duas situações: vacina ou imunidade. “Obviamente, estamos na segunda situação, isto é, começando a imunidade de rebanho. Mas, para ter esse estado, é preciso muito mais que os atuais 180 mil infectados contabilizados.” Nos cálculos dele, o valor real corresponde a cerca de 6,25 vezes mais que o registrado pelos órgãos de saúde.